Cronologia

Quanto a temperos, a cozinha medieval distinguia-se pela estrutura social. Assim, os mais pobres socorriam-se das ervas aromáticas que cresciam gratuitamente na horta, na charneca ou no prado como o louro, manjericão, tomilho, salsa, coentro, funcho, poejo, alecrim que davam sabor aos cozinhados, na sua grande maioria, cozidos. Por seu lado, a raridade das especiarias e o facto de virem de muito longe aumentava o preço tornando-as acessíveis apenas aos mais abastados. Assim, nas cozinhas nobres usava-se canela, açafrão, cravo, gengibre, pimenta, noz-moscada para temperar carnes, peixes e doces.
Talvez porque a produção era desviada para a principal função do azeite na Idade Média, não se verifica grande aplicação esta gordura vegetal predominando as gorduras animais como a banha e o toucinho. Na verdade, não só isto era verdade em territórios onde a oliveira não tinha grande expressão como o Norte, mas também parece uma evidência no restante território onde a produção de azeite era mais abundante.
As dificuldades a que o campesinato estava sujeito não o fazia desperdiçar muitos animais na alimentação. Sobressai o porco pela facilidade, quer na criação (um animal que se alimentava de quase tudo), quer na conservação das suas carnes, ora pelo fumeiro, ora pela salgadeira, ora na banha. Morto por alturas do Natal, tempo oportunamente frio, do porco tudo se aproveitava e era sustento dos mais pobres, ora enriquecendo os caldos com o resultado do fumeiro, ora satisfazendo uma gula tímida em dias de festa com as carnes da salgadeira ou conservadas em banha.
No Sul, uma geografia (mais plana, com maior exposição solar) mais favorável permitia a produção de trigo em conjunto com a cevada ficando o centeio reservado para os terrenos mais pobres. “Nos terrenos mais áridos e frios da Estrela, por toda a Beira Interior a norte da Gardunha, pelas serranias transmontanas e pelos cabeços e colinas minhotos, onde as terras mais frias e húmidas ou inóspitas se mostravam mais avessas à produção do exigente cereal nobre, então era o centeio a revestir as maiores superfícies da seara, mas ainda assim, o trigo não se ausentava por completo, a ocupar os terrenos mais fundos, abrigados ou quentes.[1] O Minho, as Beiras e a estremadura recebiam a produção do milho miúdo (ou alvo) e painço.
Neste contexto importa referir a evolução da alimentação em Portugal, sobretudo, a partir da Alta Idade Média, momento a partir do qual, por um lado, é visível o modelo cultural que se recebe da presença romana na Península Ibérica e que se traduz numa clara influência mediterrânica, por outro lado, se percebe o encontro entre esta influência e o modelo alimentar dos povos do Norte, e por outro lado ainda, se sente a influência do modelo cultural tradicional do povo árabe que entra na Península Ibéria e aí deixa influências de grande porte que acrescentam de forma substancial o modelo alimentar.
Terá sido uma aventura engraçada aquela de ir experimentando as várias partes das plantas. Gosto de ir pensando nas caras feias, nos vómitos, nas más disposições de várias ordens, nas cefaleias e até espasmos que muitos dos nossos antepassados devem ter experimentado com as várias provas que iam fazendo.
O predomínio e popularidade do tema da alimentação criou a tendência da procura dos mitos fundadores em relação às receitas e produtos. Onde, como, quem, porquê e quando parecem criar o argumento que queremos à força que seja visto como a verdadeira história de uma expressão alimentar. Na verdade, a procura de tais mitos fundadores enviesa a nossa procura, faz-nos acreditar que a resposta às nossas perguntas é límpida e consistente e se constrói como uma “história”.
Ao Sabor de Portugal